terça-feira, 17 de maio de 2011


Área de exploração em São Mateus do Sul, Brasil, de rochas de xisto, das quais se extrai o óleo (crédito: Divulgação Petrobrás)


Rio de Janeiro e São Mateus do Sul (PR) - Em uma sala decorada com enormes lustres de cristais, em um dos hotéis mais luxuosos e icônicos do Brasil – o Copacabana Palace, no Rio de Janeiro – um grupo de executivos de empresas de petróleo e gás da América do Sul reuniu-se no último dia 13 de abril para discutir o mercado de energia na região. Naturalmente, os assuntos principais giravam em torno das enormes reservas de gás natural e petróleo do pré-sal, encontradas nos últimos anos na costa brasileira. Mas uma sessão no fim da tarde despertou o interesse da plateia. Em um painel, especialistas expuseram dados sobre as reservas de gás de xisto na América do Sul.

De acordo com a Energy Information Administration (EIA), do governo americano, os países sul-americanos possuem algumas das maiores reservas de gás xisto fora da América do Norte. Enquanto os EUA e Canadá possuem cerca de 2020 trilhões de pés cúbicos (TCF) que podem ser extraídos da terra, Argentina e Brasil juntos alcançam cerca de 1225 trilhões de pés cúbicos.

O que é o gás de Xisto

O xisto é o nome mais conhecido do folhelho pirobetuminoso, formação rochosa que contém diferentes formas de combustíveis, como óleos e gases, geralmente aprisionados nas rochas superficiais ou em reservatórios profundos. A extração de gás de xisto em larga escala começou há cerca de uma década nos Estados Unidos com o uso da tecnologia de "fraturamento hidraúlico", onde grandes quantidades de água são bombeadas nos reservatórios expandindo a rocha e liberando o gás.

Nos Estados Unidos, o gás de xisto (oushale gas) tem sido apontado como uma solução para dependência das importações de petróleo e a suposta vantagem ambiental do combustível sobre o carvão. Para ler mais, vejam o especial do jornal Guardian.
A Argentina sozinha detém 65% das reservas sul-americanas. Por isso, as atenções estão voltadas para lá no momento. No ano passado, uma prospeção na bacia de Neuquém, na Patagonia, feita pela empresa YBF, contralada pela espanhola Repsol, confirmou uma jazida de 4,5 TCF na região, o equivalente a 700 milhões barris de petróleo.

A descoberta despertou verdadeira corrida do ouro nas palavras do diretor da America Petrogas Inc, Easton Wren, presente na conferência no Rio. Além da Repsol, a bacia já recebe investimentos da Chevron, Apache e Total, entre outras menores. A America Petrogas é uma delas; em Neuquém prospecta uma área de aproximadamente 600 km². “Tenho certeza que o gás de xisto será a história energética do século 21”, disse Wren durante o encontro no Rio.

Apesar dos altos custos da exploração, as empresas receberam incentivos do governo argentino para a exploração do gás, o que está atraindo empresas de tecnologia e investidores à região. Enquanto o gás natural tem preço de 5,5 dólares por BTU, o gás não convencional recebe até 7,5 dólares por BTU.

Já no Brasil, graças ao pré-sal, o setor de energia neste momento concentra-se em investimentos na costa, onde grandes reservas têm sido descobertas desde 2008. Mas o principal ator do setor no país – a estatal Petrobras - não está parado. Entre os anos 2010 – 2011, a empresa anunciou um investimento de 100 milhões de dólares somente para pesquisas na área de exploração de xisto. Isso representa 35% de todo o orçamento de pesquisa para o período.

Por ora, o foco principal da companhia é a extração do óleo do folhelho pirobetuminoso, que exige, ao invés de perfurações, a mineração de uma camada superficial da rocha.

A mineração em São Mateus do Sul

Área recuperada após a mineração em São Mateus do Sul (crédito: Divulgação Petrobrás)


A exploração é feita no Sul do Brasil, na formação Irati, considerada uma das maiores reservas mundiais de xisto. Sobre essa jazida está a cidade de São Mateus do Sul, interior do estado do Paraná, local onde desde 1972, a Petrobras opera sua unidade de Industrialização do Xisto, a Petrosix.

Atualmente são obtidos 4 mil barris/dia através de um processo industrial que consiste em moer as cerca de 7 mil toneladas diárias de xisto e submetê-las a altas temperaturas para extrair desse minério o óleo e seus derivados, como o enxofre. “Esta tecnologia termina o que a natureza começou: transforma a rocha em petróleo e gás”, explica o geólogo Fernando Mancini, da Universidade Federal do Paraná.

Entretanto, como toda atividade mineradora e industrial, a Petrosix causa impactos ambientais durante a lavra e o processamento do folhelho. No processo de abertura das minas, a retirada da vegetação e do solo locais modificam completamente a paisagem. Já no momento do processamento e refino, tem-se a emissão de gases poluentes da atividade industrial.

Para mitigar esses impactos e reabilitar as áreas mineradas, a gerente geral da Petrosix, Elza Kallas, informa que a empresa mantém estudos de biodiversidade e consegue recuperar em escala industrial as áreas exploradas desde 1979. “Mantemos um viveiro que produz 180 mil mudas de plantas nativas ao ano. Elas são replantadas nas áreas mineradas, obedecendo a densidade florestal nativa, o que viabiliza o retorno natural da fauna local”, declara.

No que se refere à qualidade do solo reabilitado, o professor do Departamento de Química da UFPR, Antonio Mangrich, orientou alguns estudos. Em 2009, sua então mestranda, Jeniffer Santos, fez uma comparação entre os primeiros 75 cm de solo de uma área nativa e da área recuperada após a mineração do xisto. Dentre os resultados, constatou que os solos eram bastante semelhantes em sua composição química, não afetando o desenvolvimento da flora e fauna local, sendo considerada efetiva a recuperação da área florestada pela Petrosix.

Mas nem sempre foi assim. Uma pesquisa no Instituto Ambiental do Paraná (IAP), órgão fiscalizador do estado, revela que a Petrosix já foi multada duas vezes nos anos recentes por descumprir normas de qualidade de água. Em 2004 e 2006, a usina teria despejado efluentes contaminados em rios importantes da região de São Mateus do Sul. O presidente do IAP, Luiz Tarcísio Pinto, assegura que no momento a empresa está com o licenciamento ambiental em dia. “Periodicamente, o Instituto recebe estudos de monitoramento. Nossos técnicos analisam o material, referentes ao controle da poluição atmosférica, dos corpos de água e de águas subterrâneas. Se não estiver tudo nos padrões, a empresa á autuada”, afirma.

A planta é considerada o motor econômico da cidade. Segundo o prefeito Luiz Adyr Gonçalves Pereira, “o município melhorou sua arrecadação de impostos, contou com a geração de empregos e com a melhoria da qualidade de vida da população”.

Na contramão da opinião do prefeito, um estudo sobre a influência das emissões atmosféricas na saúde da população de São Mateus do Sul indica que a quantidade de material particulado na região da Petrosix está acima dos padrões aceitáveis. O trabalho foi apresentado em audiência pública pelo perito Helvio Rech, Doutor em Ciências (USP) e professor da Universidade Federal do Pampa na área de avaliação de impactos ambientais.

Com o objetivo de verificar as causas da incidência de problemas respiratórios na população local, a pesquisa analisou a presença de material particulado de 2,5 micrômetros na região do entorno da mineradora. “Essas partículas pequenas não são monitoradas pela indústria, já que a legislação prevê monitoramento de partículas acima de 100 micrômetros”, explica Rech. Como resultados, o perito destaca que “analisando o xisto e comparando os elementos do minério com os dos materiais particulados é possível afirmar que o elemento poluente que foi encontrado nessas partículas, como ferro, silício e enxofre, são os que compõem o xisto. Ou seja, os elementos que estão aderidos nessas partículas tem origem nas atividades mineradoras do xisto”.

Mesmo assim, a gerente geral garante que a tecnologia Petrosix atende a todos os padrões de emissões atmosféricas. “Buscamos antecipar tecnologias e evitar emissões de qualquer tipo, antes mesmo de haver legislação para isso. Sempre trabalhamos visando minizar os impactos ambientais”, conclui.

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